Os Cocteau Twins foram uma banda escocesa de Post Punk, formada em Grangemouth, Escócia, em 1979. Os seus membros eram Elizabeth Fraser (vocais), Robin Guthrie (guitarra), Will Heggie (baixo), Simon Raymonde (baixo, em 1983, com a saída de Heggie).
Poucos grupos foram tão originais e prolíficos quanto esse trio escocês. Gravavam pela minúscula 4AD e, ao lado de New Order e Smiths, foram os maiores nomes da cena independente britânica, no que diz respeito a lançamentos e vendagens.
Com os vocais maravilhosos de Elizabeth Fraser e uma camada sonora produzida ao som de baixo, guitarra, teclado e bateria eletrônica, o Cocteau Twins teve uma das propostas sonoras mais interessantes, ainda que não funcionassem muito bem ao vivo, fato este comprovado quando a banda tocou em São Paulo no início da década de 90. O nome veio de uma velha canção do (também) grupo escocês Simple Minds. Se você acha que a voz mais exótica do pop dos anos 80 e 90 é a de Björk e nunca ouviu o Cocteau, prepare-se para reavaliar seu conceito.
Em 1982, na minúscula cidade de Grangemouth, na Escócia existia um cantinho em que um DJ chamado Robin agitava as noites locais tocando clássicos do punk e new wave, chamada Nash, uma boate localizada em um hotel. Grangemouth era tão minúscula que Robin a comparava com um banheiro. Em Nash, sempre aparecia uma garota para dançar e pular, já que não havia outra forma de divertimento. Seu nome era Elizabeth Fraser, conhecida como Liz. Robin e Will Heggie, companheiro de agitos, riam dela, a única que conseguia dançar, e embora não simpatizassem muito com a menina, conversavam entre uma canção e outra. Os três então descobriram alguns gostos comuns, e resolveram montar um grupo. Will tinha um baixo e jurava saber tocar; Robin era guitarrista e Elizabeth mostrou uma voz especialmente peculiar. Para tentarem sair da cidade e ainda fazer algum dinheiro, apostaram na música, enquanto Liz e Robin iniciavam um relacionamento. Adotaram o nome de uma antiga canção do Simple Minds, “The Cocteau Twins”, que foi gravada no álbum de estréia, Life in A Day, do grupo de Jim Kerr, lançado em 1979, com outro nome: No Cure.
O grupo tinha uma grande paixão pelo som do The Birthday Party, grupo australiano que revelou Nick Cave ao mundo. O Party gravava por um exótico selo chamado 4AD, e Robin e Liz queriam gravar seu primeiro disco pela mesma gravadora. Robin tentou (e conseguiu) conversar com Phil Clavert do Party e entregar uma demo. Phil gostou muito e fez uma importante ponte para que a 4Ad contratasse o jovem trio. “Foi muita cara-de-pau do Robin fazer isso, mas conseguimos o contrato”, lembra Liz.
Poucos grupos foram tão originais e prolíficos quanto esse trio escocês. Gravavam pela minúscula 4AD e, ao lado de New Order e Smiths, foram os maiores nomes da cena independente britânica, no que diz respeito a lançamentos e vendagens.
Com os vocais maravilhosos de Elizabeth Fraser e uma camada sonora produzida ao som de baixo, guitarra, teclado e bateria eletrônica, o Cocteau Twins teve uma das propostas sonoras mais interessantes, ainda que não funcionassem muito bem ao vivo, fato este comprovado quando a banda tocou em São Paulo no início da década de 90. O nome veio de uma velha canção do (também) grupo escocês Simple Minds. Se você acha que a voz mais exótica do pop dos anos 80 e 90 é a de Björk e nunca ouviu o Cocteau, prepare-se para reavaliar seu conceito.
Em 1982, na minúscula cidade de Grangemouth, na Escócia existia um cantinho em que um DJ chamado Robin agitava as noites locais tocando clássicos do punk e new wave, chamada Nash, uma boate localizada em um hotel. Grangemouth era tão minúscula que Robin a comparava com um banheiro. Em Nash, sempre aparecia uma garota para dançar e pular, já que não havia outra forma de divertimento. Seu nome era Elizabeth Fraser, conhecida como Liz. Robin e Will Heggie, companheiro de agitos, riam dela, a única que conseguia dançar, e embora não simpatizassem muito com a menina, conversavam entre uma canção e outra. Os três então descobriram alguns gostos comuns, e resolveram montar um grupo. Will tinha um baixo e jurava saber tocar; Robin era guitarrista e Elizabeth mostrou uma voz especialmente peculiar. Para tentarem sair da cidade e ainda fazer algum dinheiro, apostaram na música, enquanto Liz e Robin iniciavam um relacionamento. Adotaram o nome de uma antiga canção do Simple Minds, “The Cocteau Twins”, que foi gravada no álbum de estréia, Life in A Day, do grupo de Jim Kerr, lançado em 1979, com outro nome: No Cure.
O grupo tinha uma grande paixão pelo som do The Birthday Party, grupo australiano que revelou Nick Cave ao mundo. O Party gravava por um exótico selo chamado 4AD, e Robin e Liz queriam gravar seu primeiro disco pela mesma gravadora. Robin tentou (e conseguiu) conversar com Phil Clavert do Party e entregar uma demo. Phil gostou muito e fez uma importante ponte para que a 4Ad contratasse o jovem trio. “Foi muita cara-de-pau do Robin fazer isso, mas conseguimos o contrato”, lembra Liz.
O que mais chamou a atenção de Phil e da 4AD foi o som produzido pelo grupo. O baixo de Will era pesado, porém extremamente climático. Robin era um guitarrista que não se importava com solos, apenas em sons diferentes, quase minimalistas. E para complementar havia a voz de Liz, sem nenhum paralelo. Como nunca tiveram um baterista, usavam um sintetizador Roland 808. E assim lançaram o seu primeiro disco, batizado de Garlands, em 1982, que recebeu vários elogios dos semanários britânicos.
O disco de estréia ofereceu uma prova embrionária do rápido progresso que a banda teria, mostra um som atmosférico habilidosamente construído em volta do talento de Guthrie em usar criativamente a guitarra distorcida, loops e caixas de eco, ancorado no baixo rítmico de Heggie, além de uma onipresente bateria eletrônica. Mesmo sendo um belo trabalho, em comparação com aqueles que viriam a seguir, a sonoridade ainda se apresenta um tanto seca, sem a fluidez dos trabalhos vindouros. Porém, neste primeiro disco, o grupo já apresentava a definição do tipo de som que se tornaria a característica marcante do Cocteau Twins, algo à época, um tanto inclassificável. Se Robin estava mais preocupado com sons diferentes do que com solos de guitarra, o mesmo pode se dizer da relação entre o vocal de Liz Fraser e as letras das canções, pois nesse disco e muitos que viriam posteriormente, o que mais importava eram justamente os sons, pois muitas vezes, as letras cantadas por Liz eram simplesmente incompreensíveis, ou seja, mais valia a sonoridade das palavras do que o seu significado. Aliás, as letras nem sequer apareciam nos encartes dos discos. Apesar da banda defender em entrevistas que essa imprecisão não era proposital, isto acabou se tornando um mito sobre as canções do Cocteau Twins. Perguntava-se, inclusive, em que língua afinal cantava Liz Fraser, chegando-se a conclusão de que não haviam letras nas canções do Cocteau Twins, mas apenas e tão somente sons sem um significado preciso.
Uma das grandes atrações do grupo era o grande cuidado e apuro visual com as capas de discos, singles e EP, todos produzidos pela empresa de artes e design, 23 Envelope. Suas capas etéreas e abstratas tornaram-se uma marca não apenas do Cocteau, mas de quase todo o cast da 4AD, a exemplo do projeto This Mortal Coil, Colourbox, Throwing Muses, etc.
O disco alcançou a quinta posição na parada independente e ganhou um fã: o DJ John Peel. Peel ouviu a banda através do mesmo sistema que Robin apresentou o grupo ao pessoal do Birthday Party, dando-lhe uma famosa fita demo. “Estava um dia na rua e vi o (John) Peel. Pensei que era uma oportunidade muito boa para deixar escapar, me aproximei e educadamente ofereci a fita, que aceitou.” Peel, o DJ mais famoso do Reino Unido, começou a tocar o grupo e logo produziu um programa apenas com eles.
Com o sucesso, abriram shows do Modern English e do Birthday Party por toda a ilha. Aproveitando o sucesso inesperado, lançaram no final do ano o EP Lullabies, que recebeu críticas ainda mais elogiosas. O trio já mudara para Londres, e gravava em um pequeno estúdio e tinha um som diferente. “Garlands parecia uma pedra gigante amarrada em nossos pescoços. Todos esperavam que soássemos da mesma maneira e isso nunca foi nossa intenção”, conta Robin.
No ano seguinte, outro EP, Peppermint Pig, canção que fica nas parada independentes atrás apenas de “Blue Monday”, do New Order, e que teve como produtor Alan Rankine, dos Associates. E, ainda em 1983, acontece o lançamento do segundo disco Head Over Heels, que marca a saída de Heggie. Guthrie e Fraser gravam em 1983 o disco como um duo. Notadamente este é o trabalho de sonoridade mais diáfana do grupo aproximando-se mais do estilo que ficaria conhecido com ethereal, e estabeleceu a fórmula que o grupo continuaria a trabalhar durante quase toda a sua carreira. Ainda como uma dupla, fizeram o EP Sunburst and Snowblind, no mesmo ano.
No final de 1983, Simon Raymonde (ex-Drowning Croze) juntou-se à banda para a gravação do disco The Spangle Maker; enquanto o grupo durou, Raymond trouxe um reforço importante para eles, sendo um componente essencial do Cocteau Twins, gradualmente assumindo um ativo papel como escritor das letras, arranjador e produtor. Paralelamente, o grupo participou do projeto This Mortal Coil, idealizado por Ivo Watts-Russel, presidente da 4AD, originalmente um projeto que queria gravar versões de material de outros selos e artistas sem gravadoras, explorando o talento dos artistas “caseiros”, como o pessoal do Dif Juz, X Mal Deutchsland, Wolfgang Press e Dead Can Dance, com participações ocasionais de outros músicos fora da 4AD.
Robin comenta que Ivo lançou o projeto na mesma época em que o Cocteau estava sedimentando sua fama: “quando eu ouvia Song to the Siren tocar na rádio (que tinha vocais de Liz e o baixo de Simon) e nada nosso nas mesmas, me deixava doente de raiva. Simon e Liz participaram de oitos canções lançadas entre 1983 e 1984.
Simon conta porque entrou para o Cocteau: “eu sempre fui um grande fã da banda e ouvia todos comentarem como eram místicos e todas essas coisas. Nunca pensei isso, apenas que as músicas eram brilhantes e excitantes e nunca imaginei que, nem em um milhão de anos, seria um membro da banda”, explica.
Simon conta que viajava com o pessoal da 4AD durante os shows, em um dia, em Camden, enquanto Liz e Robin trabalhavam em um pequeno estúdio de 8 pistas, Simon chegou e escreveu a canção “Millimillenary”, que faria parte da coletânea The Pink Opaque, que sairia em 1985. Animado, voltou para casa afim de compor novas músicas até ser convidado por Liz e Robin para passar uma semana na Escócia escrevendo novas composições. “Millimillenary” faria parte de uma coletânea do semanário New Musical Express. O primeiro lançamento de fato do novo trio seria o EP The Spangle Maker, e em seguida, lançariam aquela que é considerada a grande obra-prima da banda (e o primeiro lançamento do grupo no Brasil), Treasure, em 1984.
Entre os muitos fatores que alçaram Treasure a categoria de obra prima, podemos citar a evolução estrutural melódica das músicas, que apresentam também efeitos sonoros cada vez mais complexos e perfeitamente burilados por Robin e Simon. As canções guardam reminescências sonoras barrocas e dark wave. A voz de Liz também sofreu uma considerável melhora, mostrando um timbre claro e delicado além de um belo alcance vocal, o que pode ser apreciado em faixas como “Persephone”. O disco inicia com a faixa “Ivo” uma clara referência ao presidente da 4AD, as outras canções têm títulos que evocam personagens místicos ou mitológicos, a exemplo de “Lorelei” e “Pandora”. Esse estilo de canções com títulos obscuros ou místicos se repetiriam em outros discos, assim como a utilização de lendas e palavras de origem celta. Essa prática se tornou tão comum que chegaram a disponibilizar um glossário em seu site oficial www.cocteautwins.com com as palavras mais incomuns que apareciam nas canções.
O disco foi votado como o melhor lançamento do ano e Liz considerada a melhor vocalista feminina por vários semanários ingleses. O grupo fez então sua primeira excursão fora da Europa, indo para o Japão onde foram assediados de forma absurda pelo fãs, o que deixou Robin surpreso: “os japoneses são carinhosos. Não era aquela histeria tipo Bealtes, mas após nossas apresentações, ficavam na porta do hotel, querendo conversar, pedir autógrafos. Quando íamos para as estações de trem, eu cheguei a ver entre 2000 a 3000 pessoas nos acompanhando.” Elizabeth completa: “o Japão é um lugar absurdo, eu estava excitada para conhecer por tudo que havia lido, e Treasure era o disco mais vendido do país e lá eles têm a mania de mudar os títulos dos discos nas capas. Treasure virou The Woman the Gods Loved. Imagino que a canção “Persephone” tenha estimulado isso.
Apesar do imenso sucesso do disco, os Cocteau Twins só executavam duas canções ao vivo, “Lorelei” e “Pandora”.
Depois do disco, O Cocteau entrou numa maratona de lançamento nos anos de 1985 e 1986, com seis discos de material inédito e uma coletânea. O primeiro deles foi o EP Aikea-Guinea, e a canção título é uma das melhores composições do grupo segundo, Robin e a favorita dos fãs em shows. Logo depois do lançamento do EP, Robin e Liz participaram de uma inusitada cover de “Respect”, de Otis Redding e que ficou imortalizada na voz de Aretha Franklin, em um álbum do Wolfgang Press, The Legendary Wolfgang Press and Other Tall Stories. Em seguida lançam mais dois Eps, Tiny Dynamine e Echoes in a Shallow Bay, que no final do ano seriam re-lançados como um EP duplo e, segundo Robin, os dois são os dois melhores discos que os Cocteau já produziram. O ano se encerra com o quarto lançamento da banda, a coletânea The Pink Opaque, com faixas desde 1982, além da primeira canção feita por Simon Raymonde, “Millimillenary”, disponível apenas na fita cassete lançada pela já citada revista New Musical Express. O disco foi realizado para funcionar como um cartão de visitas para o mercado norte-americano, já que a banda tinha assinado um acordo para a distribuição de seus trabalhos na América. E antes do ano terminar, a banda já partia para outras colaborações: Simon estava envolvido com o This Mortal Coil e Robin e Liz realizando trabalhos com o pessoal do Dif Juz e do Felt, grupo que teria um pequeno sucesso em uma canção chamada “Primitive Painters”, com vocais de Frazer. E fariam de 1986 um ano inesquecível para suas vidas com o lançamento de dois discos: Victorialand e The Moon and the Melodies.
Lançado em abril de 1986, o disco não teve a participação de Simon, envolvido com o Coil e, mais uma vez, repetindo o que tinha feito após a partida de Will, Liz e Robin realizaram um trabalho em parceria. O disco, que começou como uma maneira dos dois amantes e músicos para passarem o tempo em estúdio e trabalhando acusticamente com voz e instrumentos e lutando contra suas limitações (palavras de Robin), resultou naquele que é considerado o álbum mais aclamado da vasta discografia da banda e recebeu vários prêmios como o melhor lançamento do ano. O nome foi tirado de uma região da Antártica, e todas as canções giraram em torno desse conceito: “Throughout the Dark Months of April and May” é uma referência ao escuro inverno da região nesses meses; “Whales Tails” fala de rabos de baleia e “The Thinner in the Air”, dos ventos locais. O disco tem a colaboração delicada de Richard Thomas no saxophone e do pessoal do Dif Juz nas tablas (pequenos tambores tocado com as mãos). Nessa época começaram a ser rotulados como new age, por causa dos vocais peculiares de Liz e dos climas esparsos e etéreos da banda, o que não deixou a banda muito feliz. Robin chegou a dizer que new age era música feita por gente de mais de 50 anos e carecas. Para Simon, o rótulo apareceu apenas por causa de Victorialand, mas que new age era muzak, enquanto o Cocteau jamais soou como tal.
Para o próximo disco, resolveram ampliar seus horizontes: ao invés de um disco intiitulado Cocteau Twins, preferiam usar os nomes Simon Raymonde, Robin Guthrie and Elizabeth Fraser, ao lado do pianista Harold Budd. O nome do disco era The Moon and the Melodies. A idéia começou como um documentário de televisão, mas como viram que as músicas eram boas demais para servirem apenas como trilha de fundo, resolveram fazer um disco do grupo, acrescido de Budd, que mais uma vez colaboraria em um trabalho da banda como tecladista e compositor. Budd comparece com sons de teclado e piano que guardam uma forte influência musical de Brian Eno. Também enriquecem a sonoridade do disco a presença do sax e da bateria de Richard Thomas, do Dif Juz , nas faixas “She Will Destroy You”, “The Ghost Has No Home” e “Bloody and Blunt”, o que já havia acontecido no álbum anterior .Tudo isso combinado a guitarra de Robin e o vocal bem trabalhado de Liz, servem para criar aquilo que a banda denominaria “trilha sonora para os sonhos”. Todo o conjunto soa um tanto difuso, distante, como se realmente se tratasse de um sonho, até mesmo o piano, que parece estar sendo tocado embaixo d’água.
E se a banda era um tanto difusa e para alguns misteriosa, começaram a cercar o grupo para entrevistas, o que desagradava os membros do Cocteau. O mais intratável era sempre Robin que chegou a comentar: “Gostaria que as pessoas parassem de querer saberem sobre nossas vidas, o que gostamos, quem somos e que aceitassem os discos e pronto. Por que, raios, querem saber sobre minha filosofia de vida? Desde quando minha opinião é mais importante do que a dos outros?” Enquanto isso, lançaram mais um EP Love’s Easy Tears, com três faixas: a faixa de mesmo nome, “Sigh’s Smell of Farewell” (a minha preferida do grupo – Rubens) e “Those Eyes, That Mouth”. Posteriormente o EP seria relançado com a adição de outra canção, “Orange Appled”.
Nessa época o grupo havia construído seu próprio estúdio e ficavam horas trancados produzindo músicas, sem se importar com a morosidade das outras bandas. Robin: “ficar trancado dentro de um estúdio meses e meses não significa que queremos simplesmente fazer um trabalho diferente de outro, mas acontece que isso ocorre de uma maneira natural e acabam soando assim. Constantemente mudamos nossas atitudes e nos contradizemos, mas acho que isso é um hábito bem saudável.” Liz tentava explicar porque as letras soavam de maneira quase incompreensíveis: “nós tentamos colocar a voz bem alto na mixagem, para manter todos os efeitos longe, mas parece que sempre falhamos nisso.” Robin, discorda: “não há nada errado com a mixagem, efeitos ou a voz de Liz, é assim que ela soa. Isso quer dizer que as pessoas são incapazes de entender o que ela canta?”
Robin mostra que apesar de não gostarem de falar de outros assuntos fora a música, confessou que gostaria de ter sido convidado para o projeto Artists United Against Apartheid, organizado pelo guitarrista Little Steven, colaborador de Bruce Springsteen, de 1986, contra o regime racial da África do Sul. Posteriormente, cederiam uma canção de Victorialand para a campanha dos direitos dos animais, e outra para a paz mundial, em 1993.
“Música com mensagens têm sua hora e lugar e muitos podem e fazem isso melhor do que nós. Pegue o exemplo do Morrissey, que responde qualquer coisa porque tem grande conhecimento geral e o considero melhor falando do que cantando. Esse é um dos motivos que fazem as pessoas comprarem os discos dos Smiths, eles querem uma mensagem. Mas não é por isso que seguiremos a mesma linha”, explica Robin.
“Para mim está claro que as pessoas vejam nos títulos uma maneira de entender a canção, mas acredito que as capas também podem fazer a mesma coisa. Se um disco não mostra os nomes das músicas fica impossível dele ser publicado e evita que os jornalistas fiquem escrevendo ‘aquela música que faz hum hum hum’, essa merda toda. Em Treasure sofremos esse tipo de problemas ao dar nomes às músicas e no fim, desistimos e fizemos da maneira que achávamos melhor”, explica Liz.
Das quatro canções de Love’s Easy Tears, apenas “Those Eyes, That Mouth”, não era tocada nos shows, embora “Orange Appled”, só tenha feito parte das apresentações, a partir de 1991. Em 1987, primeiro ano desde 1982 em que não houve um lançamento oficial do grupo, eles cederam a faixa “Crush” para uma compilação da 4AD, chamada Lonely is An Eyesore, coletânea que acabou sendo lançada aqui, também.
Em 1988, lançam o disco que seria considerado por muitos como o melhor de sua carreira, Blue Bell Knoll. Sei que isso é relativo, mas de fato esse foi o disco que obteve a melhor recepção da crítica e do público. Em uma enquete feita recentemente no site oficial da banda esse trabalho foi apontado pelos fãs como o melhor já lançado, seguido de Victorialand e Treasure. O título evoca uma antiga lenda celta sobre a morte. Somente aqueles que estão próximos da morte podem ouvir o som do blue bell (uma planta gramínea que tem florzinhas em forma de sino). Segundo alguns, a banda teria nesse trabalho sofisticado demais o seu som, apesar de que realmente esse foi até então o disco que soava melhor produzido. Isso é percebido à partir da primeira faixa, e que intitula o disco (e a minha preferida da banda – Beatrix), belamente introduzida por uma delicada seqüência de loops de piano e sintetizador, que acompanham uma melodia fluida e hipnotizante. Em outras faixas do disco aparecem combinações instrumentais diferentes e variadas, que soam ao mesmo tempo ricas e exóticas. As várias camadas de guitarras e baixo se aliam aos sons de xilofone, clavicórdio e marimba produzindo uma sonoridade rica, densa e fluida, conferindo um certo tom impressionista às melodias, evocando diferentes texturas e imagens. Esse disco traz algumas das mais belas e inspiradas canções do grupo: “Carolyn’s Fingers” e “Athol-brose”. Esse foi o primeiro trabalho da banda produzido por uma major,a Capitol, além de ser o primeiro disco de estúdio lançado nos Estados Unidos.
Após o disco, o grupo tirou as primeiras férias desde o início da carreira. Robin e Liz ficaram curtindo a gravidez da cantora e o nascimento da pequena Lucy Belle. Simon casou e também virou pai com o nascimento de Stanley. O grupo investiu em um novo estúdio para trabalhar, em Twinckenham, ao sudoeste de Londres e que era conhecido por ter sido o famoso estúdio Eel Pie, de Pete Townshend, do finado The Who. A banda batizou a nova casa de September Sound, já que setembro foi o mês em que nasceram as duas crianças.
Paralelo à isso, Robin produziu vários grupos, como o Chapterouse, o Lush, o Veldt e Shellyan Orphan, enquanto Liz deu uma canja no primeiro disco-solo do bunnyman Ian McCulloch, Candleland, na faixa-título. Em 1990, lançam o novo disco Heaven or Las Vegas, que acabaria sendo o maior sucesso comercial da carreira do grupo.
Tal sucesso talvez se deva ao fato deste ser o menos experimental e mais acessível dos trabalhos da banda, o que não significa, em hipótese alguma que o grupo tenha aberto mão da inventividade sonora, contudo é um disco mais palatável para os padrões pop. É de fato o primeiro disco em que é possível entender claramente as letras cantadas por Liz. Na faixa de ritmo lento e monótono, “Fotzepolitic”, ela canta: “Meus sonhos são todos mais ou menos básicos e endereçados, são sonhos de uma garotinha…” . As canções trazem impressões sobre a maternidade (“Road, River, and Rail”), a realidade e o estresse do dia-a-dia (“Wolf in the Breast”), amor (“Pitch the Baby”) e trabalho (“Iceblink Luck”). As dez faixas que compõem o disco apresentam sonoridades diversas, que vão do hip hop em “Pitch the Baby” (que foi lançada em uma coletânea da Mute Records/4AD chamada Red Tape); suaves baladas como “Wolf in the Breast” e “Fifty-Fifty Clown”; e a beleza tépida e refinada de “Iceblink Luck” e da faixa título.
A interpretação de Liz ganha uma certa candura, talvez decorrente da maternidade. Mesmo apresentando texturas claras e brilhantes, aparentando ser um disco menos trabalhado que os anteriores, na verdade ele representa uma evolução em relação a exploração de novas tecnologias pelo grupo (especialmente por Robin, o mais ligado nessas experimentações), contudo as canções conseguem soar mais objetivas, coesas e despojadas.
Estranhamente, após o lançamento do disco, a Capitol e a 4AD resolveram lançar, em conjunto, ao invés de um single de trabalho da faixa-título, um novo título, contendo a versão do disco, uma editada e outra canção inédita, “Dials”, que foi usada como música inicial para os shows da turnê.
A turnê, aliás, foi a mais concorrida da carreira dos Cocteau Twins, com ingressos esgotados para todas as apresentações. Pela primeira vez seriam headliners (banda principal de um show) e, ainda assim, não queriam sair excursionando de maneira nenhuma. “Nós não queríamos fazer shows, mas estamos fazendo isso apenas porque há um novo álbum, mas enquanto fazíamos o disco ficávamos angustiados pensando que teríamos que tocar todas essas novas canções ao vivo”, explica Simon. Outro motivo para não quererem realizar apresentações era o longo tempo em que não tocavam certas canções. “Quando entramos em estúdio, gastamos mais da metade de uma tarde, arrumando um solo de guitarra de uma música, detalhes assim, e quando vamos tocá-las dois anos mais tarde, nem sempre conseguimos nos lembrar. Nós não ficamos ensaiando antigas músicas no estúdio como outras bandas que conhecem seu repertório de trás para frente. Não fazemos isso”, completa Robin. Para os shows na América, eles tiveram a companhia, primeiro do Mazzy Star, e depois do Veldt.
A banda percebeu que dificilmente conseguiria reproduzir o som do disco no palco, apenas com baixo, bateria, voz e tapes e que necessitariam de uma maior infra-estrutura. A solução foi a adição de dois novos guitarristas, Mitsuo Tate e Ben Blakeman. Efeitos e baterias eram executados por computadores e apenas na turnê seguinte, entre 1993/94 é que contratariam um baterista. A turnê encerrou, de forma apropriada, em Las Vegas, quando perceberam o quanto o paraíso (alusão ao “Heaven” do título) estava distante, por alguns motivos. O primeiro deles foi a declaração oficial de Ivo, avisando que o longo contrato com a 4AD estava terminado e que poderiam seguir o caminho que desejassem. Apesar disso, houve um certo constrangimento dos dois lados. Mas o maior problema era o de Robin com as drogas, que se tornava cada vez maior, adicionados a um racha interno que só fazia aumentar, embora ninguém comentasse. Apesar de todo sucesso e atenção da mídia, o grupo não estava mais feliz.
Em três anos, a única canção nova composta foi “Frosty the Snowman”, para uma revista de música, em 1992. Então a 4AD e a Capitol resolveram capitalizar em cima do hiato criativo e lançaram, em 1991, uma caixa contendo todos os inúmeros singles que o grupo gravara entre 1982 e 1990, e canções raras, sendo formada por dez cds.
Os anos de hibernação serviram para que Robin ficasse limpo em relação às drogas e que o grupo descansasse da pressão e começasse a trabalhar novamente em outras composições, que resultaria no disco Four-Calendar Café.
O disco foi lançado por um novo selo no Reino Unido, a Mercury Fontana, que veio até o Brasil assinar com o grupo, já que a Capitol era a represetante norte-americana do Cocteau. Robin explica melhor o ocorrido: “nós estávamos promovendo o Heaven or Las Vegas no Brasil, quando ficamos sabendo que algumas pessoas da Fontana queriam ir até lá para conversar conosco. Disse que poderiam vir, mas eles estão loucos se pensam que assinaremos só porque resolveram vir de tão longe para isso.”. O acerto aconteceu porque a gravadora resolveu deixar a banda totalmente livre para executar suas músicas da maneira que achasse melhor.
É o primeiro trabalho da banda após o término de um longo e estável relacionamento com a gravadora 4AD. Produzido e lançado pela Capitol Records em novembro de 1993, traz 10 faixas que foram gravadas e mixadas no September Sound, o estúdio da banda. É considerado o mais confessional dos seus trabalhos. Aqui o grupo preferiu investir mais no conteúdo que no estilo. Os temas oscilam entre as dificuldades do novo começo profissional e os problemas pessoais de seus integrantes. As canções expõem de forma bastante aberta essas questões, como nunca havia sido feito antes, quebrando um pouco a mística enigmática em torno do grupo. O disco conta com colaborações de estúdio de Lincoln Fong, além das guitarras adicionais de Mitsuo Tate e Ben Blakeman, e da bateria e percussão de Benny DiMassa e David Palfreeman. Canções como “Evangeline,” “Bluebeard” e “Know Who You Are at Every Age” representam o contínuo esforço do grupo em tornar-se mais acessível em relação às letras e melodias, contudo, sem abrir mão da fluidez e do estilo ethereal que sempre caracterizou a banda. Ao mesmo tempo em que traz pops dançantes misturados a influência de country-music, como a faixa “Bluebeard” , apresenta canções com forte carga emocional e que expõem as dificuldades e sofrimentos individuais dos integrantes da banda, inclusive uma dos maiores problemas do grupo, a dependência de Robin em relação às drogas e o álcool; à exemplo de “Theft, and Wandering Around Lost”,”Oil of Angels”,”Squeeze Wax” e “Evangeline”, que traz um delicado arranjo de guitarras e teclado rítmico.
“Eu fui o último a perceber a que ponto chegaram meus problemas por causa das drogas. Não consegui me limpar rapidamente, demorei uns seis meses. Só resolvi parar com tudo isso quando me lembrei das pessoas que haviam morrido dessa maneira, como o Sid Vicious. Eu havia me tornado um problema.”
As letras de Liz surpreenderam pela maneira direta e até crua seus problemas e dando pistas que o casamento com Robin não andava bem, e não era apenas pela questão do abuso de aditivos químicos. Em “Evangeline”, Liz fala: “Não há como voltar para trás/Não posso evitar meus sentimentos/Não sou mais a mesma/Voltei a crescer”. Em “Bluebeard”, os sentimentos são ainda mais expostos: “Você é o homem certo para mim?/Está seguro disso? É meu amigo?/Ou está intoxicado de mim?/Por que você me maltrata ou trai minha confiança?”
“Percebi que sempre fui uma pessoa muito reservada e que constantemente crio uma máscara para os outros e só agora percebi o quanto fiz isso. Não sei dizer ao certo o que está acontecendo, mas espero que não signifique que não me permita fazer mais do que realizei em Blue Bell Knoll. Gosto de ter habilidade de fazer o que sinto vontade. Neste disco estou expressando ou falando das mesmas coisas, mas não estou aprisionadas nelas. Tudo é muito doloroso e as letras refletem são mais explícitas, embora não ache o termo explícito o mais correto. Penso que são mais pessoais.”
Fraser tenta explicar o motivo de suas letras serem menos abstratas do que no passado: “No passado parece que eu queria escrever e cantar letras que eu não entendia como se eu construísse novas palavras por haver uma resma delas que não tinha a menor idéia do que significavam. Mesmo assim queria usá-las porque me sentia capaz de me expressar sem dar a menor chance de me decifrarem.”
No outono de 1993, o grupo sai promovendo o disco levando um baterista e um percussionistas reais, convidando Benny DiMassa e David Palfreeman , que haviam trabalhado no disco, além dos já habituais guitarristas Mitsuo Tate e Ben Blakeman, e no palco, pareciam mais entusiasmados do que nunca. O grupo fez então algumas experiências totalmente estranhas: a primeira delas foi participar do programa “120 Minutes” da MTV onde Robin mostrou um visível desconforto. Depois participaram do programa “Tonight Show with Jay Leno”, onde tocaram “Bluebeard” com Liz brincando bastante com sua voz e Ben usando um vestido.
Durante a turnê Liz e Robin começaram a deixar ainda mais claro que as diferenças entre eles apenas aumentavam. Enquanto Liz dizia que queria cantar antigas músicas que não eram mais realizadas, Robin desdenhava o passado, dizendo que preferia aprender outras novas para ensinar ao grupo. Robin também começou a ter atitudes de um rock-star típico, reclamando do alto custo diário da excursão: “As antigas canções são ok, assim como as novas, mas na verdade, não me importo com nenhuma delas. Tudo que gostaria era de poder parar por uma semana e aprender outras, mas não podemos fazer isso, por causa do alto custo diário. Parece um choro bobo, mas essa turnê nos custa um sem-número de milhares de dólares por dia e nós estamos perdendo dinheiro com ela. O único dinheiro que entra atualmente para mim são dos royalties. Eu não ligo para salário, mas gosto de ter meu dinheiro como qualquer outro trabalhador, mas a verdade é que já faz 3 ou 4 meses que não tenho um como qualquer pessoa normal. Se fizéssemos apenas uma excursão pela Europa, os custos seriam bem menores e ainda ganharíamos, mas privaríamos nossos fãs na América. Estou tentando ser mais razoável com o tempo porque antigamente eu mandaria os fãs à merda. Então as pessoas compram o ingressos e damos exatamente aquilo que querem. Mas eu fico me perguntando se estou sendo sincero comigo e com a minha música ou apenas fingindo ser. Hoje tento fazer a coisa certa, enquanto no passado queria apenas realizar à minha maneira, que nem sempre era a correta.”
Após a turnê, em 1994, Liz teve uma crise nervosa decorrente de toda a pressão e também admitiu que seu relacionamento com Robin não tinha mais sentindo. Mais uma vez, Robin, Liz e Simon investiram em projetos pessoais, sendo o mais curioso realizado pela cantora, que participou de um disco nunca lançado: um disco de músicas do Pink Floyd com a London Philarmonic Orchestra. Enquanto isso, uma cantora chinesa, Faye Wong (Wangfei) regravou “Know Who You Are at Every Age” e “Bluebears” de Four-Calendar Café em mandarim.
Em 1995, os ânimos estavam mais serenados e o grupo resolveu fazer algo em que sempre foram mestres, um EP, que acabaram virando dois: Twinlights e Otherness.
“Estamos bem melhores agora e foi bom esse pesadelo ter acontecido porque percebemos que se amamos alguém, não importa o quanto ela desça e você continuará a amando. É algo estressante, de fato, porque é um casamento entre três pessoas, mas ao mesmo tempo, muito prazeroso.”
Os EPs foram um processo natural, segundo Liz: “nós queríamos voltar a produzir e imaginamos que um EP, por ser mais curto que um disco seria o melhor caminho”. A opinião era compartilhada por Simon: “é um tipo de exercício. Escrevemos pequenas canções para ver onde queríamos chegar.”
Na canção “Rilkean Heart”, de Twinlights, inspirada no poeta alemão Rainer Maria Rilke, Liz canta sobre o amor e cita Jeff Buckley, cantor, compositor, filho de Tim Buckley e que morreria no ano seguinte, afogado. Muitos diziam que Jeff era a grande paixão de Liz desde que a separação de Robin acontecera, fato que ela jamais comentou, especialmente após a morte de Buckley. A única coisa que disse à epoca foi “é realmente algo cafone falar assim, mas eu estou me sentindo terrivelmente faminta por amor, e me sinto compulsiva com isso.”
A música acabou gerando um projeto novo. O cineasta Drik Van Dooren e desenhista gráfico Tomato resolveram fazer um curta-metragem em cima de “Rilkean Heart”. Mesmo sem o apoio da Mercury Fontana, o grupo bancou o projeto, rodado em 16 mm e Super 8, e que acabou ganhando o prêmio do Grande Júri no Festival de Cinema em Charleston, na Carolina do Sul.
Tudo isso faria que a gravação do último disco oficial do Cocteau Twins, Milk & Kisses fosse realizado em uma harmonia de grande paz e alegria. Esse trabalho representa um retorno às raízes musicais do grupo. Estão presentes as antigas texturas e camadas de guitarras e voz, linhas de baixo, e as letras obscuras e ininteligíveis que tanto caracterizaram o grupo e fizeram a sua mística. Um exemplo é a faixa de abertura, “Violaine”, uma espécie de rock’n’roll estilo Cocteau Twins, com uma linha de baixo funk e camadas de guitarra distorcida, acompanhadas da voz de Liz, que canta uma letra totalmente incompreensível, que seria uma espécie de brincadeira sobre mensagens ocultas em canções. “Half-Gifts” e “Rilkean Heart,” que apareceram em um formato semi-acústico no EP Twinlights reaparecem em versões diferentes, mais eletrônicas. Merecem destaque as pérolas pop “Tishbite,” “Calfskin Smack” e “Ups”, além da faixa “Eperdu” que recria um clima fluido como ondas oceânicas, uma referência ao local onde o álbum foi escrito, na costa francesa (Eperdu é o equivalente em francês arcaico à expressão es perdu, “está perdido”). “Treasue Hand” mostra a banda de volta a sua melhor forma, uma bela canção construída sobre um clima sereno e contemplativo que encaminha-se lentamente rumo a uma tensão que explode repentinamente, em uma fórmula semelhante à canções anteriores da banda como “Donimo” (Treasure) e “Pur” (Four-Calendar Café). É um trabalho memorável, que ilustra a caminhada de um dos grupos mais criativo e inovadores das últimas décadas, e traz tudo que um bom álbum do Cocteau Twins pode dar: som hipnótico, onírico, embalado por vozes etéreas, sons líquidos e delicadas texturas sonoras.
Robin define a gravação desse trabalho como uma experiência prazerosa. Elas foram gravadas na ciidade de Brittany, na França, onde a nova esposa de Robin vivia. Segundo ele, foi a primeira vez na carreira em que os três trabalharam ao mesmo tempo em estúdio, já que no passado, cada um fazia sua parte em horas diferentes. “Quando líamos sobre a vibração dos outros grupos trabalhando juntos em um estúdio, achávamos isso uma grande besteira, porque para nós sempre foi extremamente alienante. E descobrimos que esses dois meses juntos, todos os dias foram muito agradáveis.” Simon fala que a melhor coisa do disco foi a rapidez: “Robin e eu escrevíamos uma canção e não precisamos ficar esperando que a musa eterna viesse visitar Liz para que cantasse.”
Uma última excursão mostrou a banda ainda mais madura. Com vários músicos no palco, entre eles um tecladista, a banda soou mais alegre do que antes, cantando vários clássicos da época de Garlands, passando por Heaven Over Heels e Treasure. Após o final das apresentações, eles ficaram livres do contrato com a Mercury Fontana e tiveram que negar que se separariam, dizendo que estavam felizes de terem saído da “grande máquina”. Fundaram um selo próprio, Bella Union, e de forma surpreendente, anunciaram em 1998, em meio às gravações de um novo trabalho, que iriam encerrar as atividades. Simon tenta explicar os motivos: “Sempre houve uma grande dificuldade desde a separação de Liz e Robin, em 1993. Foi um período duro, com excursões e pressão. Eles acabaram se tornando amigos novamente, mas logo arranjaram outros companheiros, o que gerou uma grande tensão. Talvez todos tivéssemos medo de ficar sem a banda e por isso, sempre conseguíamos criar um bom ambiente de trabalho. Todos queríamos deixar a Mercury e desde os tempos da 4AD sonhávamos com um selo nosso… Começamos a trabalhar e estávamos perto do final, com 15 ou 16 novas canções e Liz já tinha colocado a voz em sete delas. Não sei o real motivo pelo qual ela resolveu partir, já que em duas semanas todas as canções estariam finalizadas. Foi um choque, pois eram coisas maravilhosas, com influências diversas. Enfim, nossa separação será um outro muito sobre a lenda acerca dos Cocteau Twins.”
Com a separação, o grupo deixou alguns legados. Em 1999, pela Bella, lançaram um CD duplo com gravações na BBC, entre 1982 e 1996, o BBC Sessions. Simon explica que fizeram o disco por acharem que tinham uma dívida com John Peel. São trinta faixas divididas em dois discos. Todas são músicas do Cocteau Twins, com exceção de Strange Fruit, uma cover de uma canção de autoria de Lewis Allan, de 1939, que ficou celebrizada nas vozes de Billie Holliday e Josephine Baker. Foi cantada por Liz em uma Peel Session em outubro de 1983. A única música inédita é a instrumental “My Hue and Cry”.
Em 2000 é lançado Stars and Topsoil, uma coletânea de 18 faixas, dos melhores trabalhos da banda gravados entre 1982 e 1990 pela 4AD Records. As faixas foram rigorosamente selecionadas pelos membros da banda e remasterizadas por Robin e Walter Coelho, um engenheiro de som e produtor brasileiro especializado em música eletrônica. O título da coletânea, que foi dado por Liz, sugere uma mistura entre bem e mal, céu e terra, talvez uma reflexão sobre as experiências boas e más, que grupo viveu nos seus 19 anos de carreira. Esta coletânea foi lançada no Brasil e continua em catálogo.
Após o término da banda em 1997, seus integrantes continuaram produzindo musicalmente, ainda que de maneira esparsa, participando de colaborações com outros artistas e bandas. Simon ainda lançou um disco-solo muito elogiado chamado Blame Someone Else, em 1998. Logo após este lançamento Robin anunciou que voltaria a escrever novamente. Montou um novo projeto musical com a vocalista Siobahn De Maré (ex-Mono), chamado Violet Indiana. A primeira gravação do grupo foi o EP lançado em 2000, intitulado Choke, logo seguido do disco Roulette em 2001,dos singles Killer Eyes do mesmo ano e Cassino, de 2002. O novo projeto de Robin traz harmonias e texturas de guitarra muito próximas aos antigos trabalhos do Cocteau Twins, em meio a um pop com influências de cool jazz.
Quanto a Liz Fraser, fez participações vocais em trabalhos de diversos artistas. Mudou-se com seu novo parceiro, Damon Reece (membro do Spiritualized) em 1998 para Bristol, lar da cena trip-hop inglesa. Em 1998 participou do álbum Mezzanine da banda Massive Attack nas faixas “Teardrop,” “Black Milk” and “Group Four”, chegando a acompanhar a turnê britânica da banda. No mesmo ano participou da gravação do disco de Craig Armstrong, The Space Between Us, com a canção “This Love” . Em 1999 foi convidada por Peter Gabriel para participar de seu controverso projeto conceitual OVO, que tratava da comemoração da chegada do novo milénio. Liz aceitou e compareceu em duas faixas “Downside Up” e “Make Tomorrow”. Também participou da gravação da trilha sonora de diversos filmes, entre os quais o britânico The Winter Guest e o americano In Dreams. Seus trabalhos mais recente são participações nas trilhas sonoras dos filmes O senhor dos Anéis: a sociedade do anel (Lothlorien (Lament for Gandalf)) e O senhor dos Anéis: As duas Torres (Isengard Unleashed).
Até o final de 2003 a gravadora 4AD está prometendo um relançamento de seis discos do Cocteau Twins originalmente lançados pelo selo: Garlands, Head Over Heels, Treasure, Victorialand, Blue Bell Knoll e Heaven or Las Vegas. Os álbuns serão digitalmente remasterizados por Robin Guthrie, e terão o design e a arte de capa revisados (o que está deixando os antigos fãs da banda preocupados). Esse relançamento é bastante justo, pois mesmo após o fim do grupo, e sem que seus ex-integrantes tenham, em suas carreiras solo, feito algo de semelhante relevo em comparação aos trabalhos antigos do Cocteau Twins, é inegável a importância que o grupo tem ainda hoje, influenciando diversos grupos e artistas da atualidade.
E se a banda era um tanto difusa e para alguns misteriosa, começaram a cercar o grupo para entrevistas, o que desagradava os membros do Cocteau. O mais intratável era sempre Robin que chegou a comentar: “Gostaria que as pessoas parassem de querer saberem sobre nossas vidas, o que gostamos, quem somos e que aceitassem os discos e pronto. Por que, raios, querem saber sobre minha filosofia de vida? Desde quando minha opinião é mais importante do que a dos outros?” Enquanto isso, lançaram mais um EP Love’s Easy Tears, com três faixas: a faixa de mesmo nome, “Sigh’s Smell of Farewell” (a minha preferida do grupo – Rubens) e “Those Eyes, That Mouth”. Posteriormente o EP seria relançado com a adição de outra canção, “Orange Appled”.
Nessa época o grupo havia construído seu próprio estúdio e ficavam horas trancados produzindo músicas, sem se importar com a morosidade das outras bandas. Robin: “ficar trancado dentro de um estúdio meses e meses não significa que queremos simplesmente fazer um trabalho diferente de outro, mas acontece que isso ocorre de uma maneira natural e acabam soando assim. Constantemente mudamos nossas atitudes e nos contradizemos, mas acho que isso é um hábito bem saudável.” Liz tentava explicar porque as letras soavam de maneira quase incompreensíveis: “nós tentamos colocar a voz bem alto na mixagem, para manter todos os efeitos longe, mas parece que sempre falhamos nisso.” Robin, discorda: “não há nada errado com a mixagem, efeitos ou a voz de Liz, é assim que ela soa. Isso quer dizer que as pessoas são incapazes de entender o que ela canta?”
Robin mostra que apesar de não gostarem de falar de outros assuntos fora a música, confessou que gostaria de ter sido convidado para o projeto Artists United Against Apartheid, organizado pelo guitarrista Little Steven, colaborador de Bruce Springsteen, de 1986, contra o regime racial da África do Sul. Posteriormente, cederiam uma canção de Victorialand para a campanha dos direitos dos animais, e outra para a paz mundial, em 1993.
“Música com mensagens têm sua hora e lugar e muitos podem e fazem isso melhor do que nós. Pegue o exemplo do Morrissey, que responde qualquer coisa porque tem grande conhecimento geral e o considero melhor falando do que cantando. Esse é um dos motivos que fazem as pessoas comprarem os discos dos Smiths, eles querem uma mensagem. Mas não é por isso que seguiremos a mesma linha”, explica Robin.
“Para mim está claro que as pessoas vejam nos títulos uma maneira de entender a canção, mas acredito que as capas também podem fazer a mesma coisa. Se um disco não mostra os nomes das músicas fica impossível dele ser publicado e evita que os jornalistas fiquem escrevendo ‘aquela música que faz hum hum hum’, essa merda toda. Em Treasure sofremos esse tipo de problemas ao dar nomes às músicas e no fim, desistimos e fizemos da maneira que achávamos melhor”, explica Liz.
Das quatro canções de Love’s Easy Tears, apenas “Those Eyes, That Mouth”, não era tocada nos shows, embora “Orange Appled”, só tenha feito parte das apresentações, a partir de 1991. Em 1987, primeiro ano desde 1982 em que não houve um lançamento oficial do grupo, eles cederam a faixa “Crush” para uma compilação da 4AD, chamada Lonely is An Eyesore, coletânea que acabou sendo lançada aqui, também.
Em 1988, lançam o disco que seria considerado por muitos como o melhor de sua carreira, Blue Bell Knoll. Sei que isso é relativo, mas de fato esse foi o disco que obteve a melhor recepção da crítica e do público. Em uma enquete feita recentemente no site oficial da banda esse trabalho foi apontado pelos fãs como o melhor já lançado, seguido de Victorialand e Treasure. O título evoca uma antiga lenda celta sobre a morte. Somente aqueles que estão próximos da morte podem ouvir o som do blue bell (uma planta gramínea que tem florzinhas em forma de sino). Segundo alguns, a banda teria nesse trabalho sofisticado demais o seu som, apesar de que realmente esse foi até então o disco que soava melhor produzido. Isso é percebido à partir da primeira faixa, e que intitula o disco (e a minha preferida da banda – Beatrix), belamente introduzida por uma delicada seqüência de loops de piano e sintetizador, que acompanham uma melodia fluida e hipnotizante. Em outras faixas do disco aparecem combinações instrumentais diferentes e variadas, que soam ao mesmo tempo ricas e exóticas. As várias camadas de guitarras e baixo se aliam aos sons de xilofone, clavicórdio e marimba produzindo uma sonoridade rica, densa e fluida, conferindo um certo tom impressionista às melodias, evocando diferentes texturas e imagens. Esse disco traz algumas das mais belas e inspiradas canções do grupo: “Carolyn’s Fingers” e “Athol-brose”. Esse foi o primeiro trabalho da banda produzido por uma major,a Capitol, além de ser o primeiro disco de estúdio lançado nos Estados Unidos.
Após o disco, o grupo tirou as primeiras férias desde o início da carreira. Robin e Liz ficaram curtindo a gravidez da cantora e o nascimento da pequena Lucy Belle. Simon casou e também virou pai com o nascimento de Stanley. O grupo investiu em um novo estúdio para trabalhar, em Twinckenham, ao sudoeste de Londres e que era conhecido por ter sido o famoso estúdio Eel Pie, de Pete Townshend, do finado The Who. A banda batizou a nova casa de September Sound, já que setembro foi o mês em que nasceram as duas crianças.
Paralelo à isso, Robin produziu vários grupos, como o Chapterouse, o Lush, o Veldt e Shellyan Orphan, enquanto Liz deu uma canja no primeiro disco-solo do bunnyman Ian McCulloch, Candleland, na faixa-título. Em 1990, lançam o novo disco Heaven or Las Vegas, que acabaria sendo o maior sucesso comercial da carreira do grupo.
Tal sucesso talvez se deva ao fato deste ser o menos experimental e mais acessível dos trabalhos da banda, o que não significa, em hipótese alguma que o grupo tenha aberto mão da inventividade sonora, contudo é um disco mais palatável para os padrões pop. É de fato o primeiro disco em que é possível entender claramente as letras cantadas por Liz. Na faixa de ritmo lento e monótono, “Fotzepolitic”, ela canta: “Meus sonhos são todos mais ou menos básicos e endereçados, são sonhos de uma garotinha…” . As canções trazem impressões sobre a maternidade (“Road, River, and Rail”), a realidade e o estresse do dia-a-dia (“Wolf in the Breast”), amor (“Pitch the Baby”) e trabalho (“Iceblink Luck”). As dez faixas que compõem o disco apresentam sonoridades diversas, que vão do hip hop em “Pitch the Baby” (que foi lançada em uma coletânea da Mute Records/4AD chamada Red Tape); suaves baladas como “Wolf in the Breast” e “Fifty-Fifty Clown”; e a beleza tépida e refinada de “Iceblink Luck” e da faixa título.
A interpretação de Liz ganha uma certa candura, talvez decorrente da maternidade. Mesmo apresentando texturas claras e brilhantes, aparentando ser um disco menos trabalhado que os anteriores, na verdade ele representa uma evolução em relação a exploração de novas tecnologias pelo grupo (especialmente por Robin, o mais ligado nessas experimentações), contudo as canções conseguem soar mais objetivas, coesas e despojadas.
Estranhamente, após o lançamento do disco, a Capitol e a 4AD resolveram lançar, em conjunto, ao invés de um single de trabalho da faixa-título, um novo título, contendo a versão do disco, uma editada e outra canção inédita, “Dials”, que foi usada como música inicial para os shows da turnê.
A turnê, aliás, foi a mais concorrida da carreira dos Cocteau Twins, com ingressos esgotados para todas as apresentações. Pela primeira vez seriam headliners (banda principal de um show) e, ainda assim, não queriam sair excursionando de maneira nenhuma. “Nós não queríamos fazer shows, mas estamos fazendo isso apenas porque há um novo álbum, mas enquanto fazíamos o disco ficávamos angustiados pensando que teríamos que tocar todas essas novas canções ao vivo”, explica Simon. Outro motivo para não quererem realizar apresentações era o longo tempo em que não tocavam certas canções. “Quando entramos em estúdio, gastamos mais da metade de uma tarde, arrumando um solo de guitarra de uma música, detalhes assim, e quando vamos tocá-las dois anos mais tarde, nem sempre conseguimos nos lembrar. Nós não ficamos ensaiando antigas músicas no estúdio como outras bandas que conhecem seu repertório de trás para frente. Não fazemos isso”, completa Robin. Para os shows na América, eles tiveram a companhia, primeiro do Mazzy Star, e depois do Veldt.
A banda percebeu que dificilmente conseguiria reproduzir o som do disco no palco, apenas com baixo, bateria, voz e tapes e que necessitariam de uma maior infra-estrutura. A solução foi a adição de dois novos guitarristas, Mitsuo Tate e Ben Blakeman. Efeitos e baterias eram executados por computadores e apenas na turnê seguinte, entre 1993/94 é que contratariam um baterista. A turnê encerrou, de forma apropriada, em Las Vegas, quando perceberam o quanto o paraíso (alusão ao “Heaven” do título) estava distante, por alguns motivos. O primeiro deles foi a declaração oficial de Ivo, avisando que o longo contrato com a 4AD estava terminado e que poderiam seguir o caminho que desejassem. Apesar disso, houve um certo constrangimento dos dois lados. Mas o maior problema era o de Robin com as drogas, que se tornava cada vez maior, adicionados a um racha interno que só fazia aumentar, embora ninguém comentasse. Apesar de todo sucesso e atenção da mídia, o grupo não estava mais feliz.
Em três anos, a única canção nova composta foi “Frosty the Snowman”, para uma revista de música, em 1992. Então a 4AD e a Capitol resolveram capitalizar em cima do hiato criativo e lançaram, em 1991, uma caixa contendo todos os inúmeros singles que o grupo gravara entre 1982 e 1990, e canções raras, sendo formada por dez cds.
Os anos de hibernação serviram para que Robin ficasse limpo em relação às drogas e que o grupo descansasse da pressão e começasse a trabalhar novamente em outras composições, que resultaria no disco Four-Calendar Café.
O disco foi lançado por um novo selo no Reino Unido, a Mercury Fontana, que veio até o Brasil assinar com o grupo, já que a Capitol era a represetante norte-americana do Cocteau. Robin explica melhor o ocorrido: “nós estávamos promovendo o Heaven or Las Vegas no Brasil, quando ficamos sabendo que algumas pessoas da Fontana queriam ir até lá para conversar conosco. Disse que poderiam vir, mas eles estão loucos se pensam que assinaremos só porque resolveram vir de tão longe para isso.”. O acerto aconteceu porque a gravadora resolveu deixar a banda totalmente livre para executar suas músicas da maneira que achasse melhor.
É o primeiro trabalho da banda após o término de um longo e estável relacionamento com a gravadora 4AD. Produzido e lançado pela Capitol Records em novembro de 1993, traz 10 faixas que foram gravadas e mixadas no September Sound, o estúdio da banda. É considerado o mais confessional dos seus trabalhos. Aqui o grupo preferiu investir mais no conteúdo que no estilo. Os temas oscilam entre as dificuldades do novo começo profissional e os problemas pessoais de seus integrantes. As canções expõem de forma bastante aberta essas questões, como nunca havia sido feito antes, quebrando um pouco a mística enigmática em torno do grupo. O disco conta com colaborações de estúdio de Lincoln Fong, além das guitarras adicionais de Mitsuo Tate e Ben Blakeman, e da bateria e percussão de Benny DiMassa e David Palfreeman. Canções como “Evangeline,” “Bluebeard” e “Know Who You Are at Every Age” representam o contínuo esforço do grupo em tornar-se mais acessível em relação às letras e melodias, contudo, sem abrir mão da fluidez e do estilo ethereal que sempre caracterizou a banda. Ao mesmo tempo em que traz pops dançantes misturados a influência de country-music, como a faixa “Bluebeard” , apresenta canções com forte carga emocional e que expõem as dificuldades e sofrimentos individuais dos integrantes da banda, inclusive uma dos maiores problemas do grupo, a dependência de Robin em relação às drogas e o álcool; à exemplo de “Theft, and Wandering Around Lost”,”Oil of Angels”,”Squeeze Wax” e “Evangeline”, que traz um delicado arranjo de guitarras e teclado rítmico.
“Eu fui o último a perceber a que ponto chegaram meus problemas por causa das drogas. Não consegui me limpar rapidamente, demorei uns seis meses. Só resolvi parar com tudo isso quando me lembrei das pessoas que haviam morrido dessa maneira, como o Sid Vicious. Eu havia me tornado um problema.”
As letras de Liz surpreenderam pela maneira direta e até crua seus problemas e dando pistas que o casamento com Robin não andava bem, e não era apenas pela questão do abuso de aditivos químicos. Em “Evangeline”, Liz fala: “Não há como voltar para trás/Não posso evitar meus sentimentos/Não sou mais a mesma/Voltei a crescer”. Em “Bluebeard”, os sentimentos são ainda mais expostos: “Você é o homem certo para mim?/Está seguro disso? É meu amigo?/Ou está intoxicado de mim?/Por que você me maltrata ou trai minha confiança?”
“Percebi que sempre fui uma pessoa muito reservada e que constantemente crio uma máscara para os outros e só agora percebi o quanto fiz isso. Não sei dizer ao certo o que está acontecendo, mas espero que não signifique que não me permita fazer mais do que realizei em Blue Bell Knoll. Gosto de ter habilidade de fazer o que sinto vontade. Neste disco estou expressando ou falando das mesmas coisas, mas não estou aprisionadas nelas. Tudo é muito doloroso e as letras refletem são mais explícitas, embora não ache o termo explícito o mais correto. Penso que são mais pessoais.”
Fraser tenta explicar o motivo de suas letras serem menos abstratas do que no passado: “No passado parece que eu queria escrever e cantar letras que eu não entendia como se eu construísse novas palavras por haver uma resma delas que não tinha a menor idéia do que significavam. Mesmo assim queria usá-las porque me sentia capaz de me expressar sem dar a menor chance de me decifrarem.”
No outono de 1993, o grupo sai promovendo o disco levando um baterista e um percussionistas reais, convidando Benny DiMassa e David Palfreeman , que haviam trabalhado no disco, além dos já habituais guitarristas Mitsuo Tate e Ben Blakeman, e no palco, pareciam mais entusiasmados do que nunca. O grupo fez então algumas experiências totalmente estranhas: a primeira delas foi participar do programa “120 Minutes” da MTV onde Robin mostrou um visível desconforto. Depois participaram do programa “Tonight Show with Jay Leno”, onde tocaram “Bluebeard” com Liz brincando bastante com sua voz e Ben usando um vestido.
Durante a turnê Liz e Robin começaram a deixar ainda mais claro que as diferenças entre eles apenas aumentavam. Enquanto Liz dizia que queria cantar antigas músicas que não eram mais realizadas, Robin desdenhava o passado, dizendo que preferia aprender outras novas para ensinar ao grupo. Robin também começou a ter atitudes de um rock-star típico, reclamando do alto custo diário da excursão: “As antigas canções são ok, assim como as novas, mas na verdade, não me importo com nenhuma delas. Tudo que gostaria era de poder parar por uma semana e aprender outras, mas não podemos fazer isso, por causa do alto custo diário. Parece um choro bobo, mas essa turnê nos custa um sem-número de milhares de dólares por dia e nós estamos perdendo dinheiro com ela. O único dinheiro que entra atualmente para mim são dos royalties. Eu não ligo para salário, mas gosto de ter meu dinheiro como qualquer outro trabalhador, mas a verdade é que já faz 3 ou 4 meses que não tenho um como qualquer pessoa normal. Se fizéssemos apenas uma excursão pela Europa, os custos seriam bem menores e ainda ganharíamos, mas privaríamos nossos fãs na América. Estou tentando ser mais razoável com o tempo porque antigamente eu mandaria os fãs à merda. Então as pessoas compram o ingressos e damos exatamente aquilo que querem. Mas eu fico me perguntando se estou sendo sincero comigo e com a minha música ou apenas fingindo ser. Hoje tento fazer a coisa certa, enquanto no passado queria apenas realizar à minha maneira, que nem sempre era a correta.”
Após a turnê, em 1994, Liz teve uma crise nervosa decorrente de toda a pressão e também admitiu que seu relacionamento com Robin não tinha mais sentindo. Mais uma vez, Robin, Liz e Simon investiram em projetos pessoais, sendo o mais curioso realizado pela cantora, que participou de um disco nunca lançado: um disco de músicas do Pink Floyd com a London Philarmonic Orchestra. Enquanto isso, uma cantora chinesa, Faye Wong (Wangfei) regravou “Know Who You Are at Every Age” e “Bluebears” de Four-Calendar Café em mandarim.
Em 1995, os ânimos estavam mais serenados e o grupo resolveu fazer algo em que sempre foram mestres, um EP, que acabaram virando dois: Twinlights e Otherness.
“Estamos bem melhores agora e foi bom esse pesadelo ter acontecido porque percebemos que se amamos alguém, não importa o quanto ela desça e você continuará a amando. É algo estressante, de fato, porque é um casamento entre três pessoas, mas ao mesmo tempo, muito prazeroso.”
Os EPs foram um processo natural, segundo Liz: “nós queríamos voltar a produzir e imaginamos que um EP, por ser mais curto que um disco seria o melhor caminho”. A opinião era compartilhada por Simon: “é um tipo de exercício. Escrevemos pequenas canções para ver onde queríamos chegar.”
Na canção “Rilkean Heart”, de Twinlights, inspirada no poeta alemão Rainer Maria Rilke, Liz canta sobre o amor e cita Jeff Buckley, cantor, compositor, filho de Tim Buckley e que morreria no ano seguinte, afogado. Muitos diziam que Jeff era a grande paixão de Liz desde que a separação de Robin acontecera, fato que ela jamais comentou, especialmente após a morte de Buckley. A única coisa que disse à epoca foi “é realmente algo cafone falar assim, mas eu estou me sentindo terrivelmente faminta por amor, e me sinto compulsiva com isso.”
A música acabou gerando um projeto novo. O cineasta Drik Van Dooren e desenhista gráfico Tomato resolveram fazer um curta-metragem em cima de “Rilkean Heart”. Mesmo sem o apoio da Mercury Fontana, o grupo bancou o projeto, rodado em 16 mm e Super 8, e que acabou ganhando o prêmio do Grande Júri no Festival de Cinema em Charleston, na Carolina do Sul.
Tudo isso faria que a gravação do último disco oficial do Cocteau Twins, Milk & Kisses fosse realizado em uma harmonia de grande paz e alegria. Esse trabalho representa um retorno às raízes musicais do grupo. Estão presentes as antigas texturas e camadas de guitarras e voz, linhas de baixo, e as letras obscuras e ininteligíveis que tanto caracterizaram o grupo e fizeram a sua mística. Um exemplo é a faixa de abertura, “Violaine”, uma espécie de rock’n’roll estilo Cocteau Twins, com uma linha de baixo funk e camadas de guitarra distorcida, acompanhadas da voz de Liz, que canta uma letra totalmente incompreensível, que seria uma espécie de brincadeira sobre mensagens ocultas em canções. “Half-Gifts” e “Rilkean Heart,” que apareceram em um formato semi-acústico no EP Twinlights reaparecem em versões diferentes, mais eletrônicas. Merecem destaque as pérolas pop “Tishbite,” “Calfskin Smack” e “Ups”, além da faixa “Eperdu” que recria um clima fluido como ondas oceânicas, uma referência ao local onde o álbum foi escrito, na costa francesa (Eperdu é o equivalente em francês arcaico à expressão es perdu, “está perdido”). “Treasue Hand” mostra a banda de volta a sua melhor forma, uma bela canção construída sobre um clima sereno e contemplativo que encaminha-se lentamente rumo a uma tensão que explode repentinamente, em uma fórmula semelhante à canções anteriores da banda como “Donimo” (Treasure) e “Pur” (Four-Calendar Café). É um trabalho memorável, que ilustra a caminhada de um dos grupos mais criativo e inovadores das últimas décadas, e traz tudo que um bom álbum do Cocteau Twins pode dar: som hipnótico, onírico, embalado por vozes etéreas, sons líquidos e delicadas texturas sonoras.
Robin define a gravação desse trabalho como uma experiência prazerosa. Elas foram gravadas na ciidade de Brittany, na França, onde a nova esposa de Robin vivia. Segundo ele, foi a primeira vez na carreira em que os três trabalharam ao mesmo tempo em estúdio, já que no passado, cada um fazia sua parte em horas diferentes. “Quando líamos sobre a vibração dos outros grupos trabalhando juntos em um estúdio, achávamos isso uma grande besteira, porque para nós sempre foi extremamente alienante. E descobrimos que esses dois meses juntos, todos os dias foram muito agradáveis.” Simon fala que a melhor coisa do disco foi a rapidez: “Robin e eu escrevíamos uma canção e não precisamos ficar esperando que a musa eterna viesse visitar Liz para que cantasse.”
Uma última excursão mostrou a banda ainda mais madura. Com vários músicos no palco, entre eles um tecladista, a banda soou mais alegre do que antes, cantando vários clássicos da época de Garlands, passando por Heaven Over Heels e Treasure. Após o final das apresentações, eles ficaram livres do contrato com a Mercury Fontana e tiveram que negar que se separariam, dizendo que estavam felizes de terem saído da “grande máquina”. Fundaram um selo próprio, Bella Union, e de forma surpreendente, anunciaram em 1998, em meio às gravações de um novo trabalho, que iriam encerrar as atividades. Simon tenta explicar os motivos: “Sempre houve uma grande dificuldade desde a separação de Liz e Robin, em 1993. Foi um período duro, com excursões e pressão. Eles acabaram se tornando amigos novamente, mas logo arranjaram outros companheiros, o que gerou uma grande tensão. Talvez todos tivéssemos medo de ficar sem a banda e por isso, sempre conseguíamos criar um bom ambiente de trabalho. Todos queríamos deixar a Mercury e desde os tempos da 4AD sonhávamos com um selo nosso… Começamos a trabalhar e estávamos perto do final, com 15 ou 16 novas canções e Liz já tinha colocado a voz em sete delas. Não sei o real motivo pelo qual ela resolveu partir, já que em duas semanas todas as canções estariam finalizadas. Foi um choque, pois eram coisas maravilhosas, com influências diversas. Enfim, nossa separação será um outro muito sobre a lenda acerca dos Cocteau Twins.”
Com a separação, o grupo deixou alguns legados. Em 1999, pela Bella, lançaram um CD duplo com gravações na BBC, entre 1982 e 1996, o BBC Sessions. Simon explica que fizeram o disco por acharem que tinham uma dívida com John Peel. São trinta faixas divididas em dois discos. Todas são músicas do Cocteau Twins, com exceção de Strange Fruit, uma cover de uma canção de autoria de Lewis Allan, de 1939, que ficou celebrizada nas vozes de Billie Holliday e Josephine Baker. Foi cantada por Liz em uma Peel Session em outubro de 1983. A única música inédita é a instrumental “My Hue and Cry”.
Em 2000 é lançado Stars and Topsoil, uma coletânea de 18 faixas, dos melhores trabalhos da banda gravados entre 1982 e 1990 pela 4AD Records. As faixas foram rigorosamente selecionadas pelos membros da banda e remasterizadas por Robin e Walter Coelho, um engenheiro de som e produtor brasileiro especializado em música eletrônica. O título da coletânea, que foi dado por Liz, sugere uma mistura entre bem e mal, céu e terra, talvez uma reflexão sobre as experiências boas e más, que grupo viveu nos seus 19 anos de carreira. Esta coletânea foi lançada no Brasil e continua em catálogo.
Após o término da banda em 1997, seus integrantes continuaram produzindo musicalmente, ainda que de maneira esparsa, participando de colaborações com outros artistas e bandas. Simon ainda lançou um disco-solo muito elogiado chamado Blame Someone Else, em 1998. Logo após este lançamento Robin anunciou que voltaria a escrever novamente. Montou um novo projeto musical com a vocalista Siobahn De Maré (ex-Mono), chamado Violet Indiana. A primeira gravação do grupo foi o EP lançado em 2000, intitulado Choke, logo seguido do disco Roulette em 2001,dos singles Killer Eyes do mesmo ano e Cassino, de 2002. O novo projeto de Robin traz harmonias e texturas de guitarra muito próximas aos antigos trabalhos do Cocteau Twins, em meio a um pop com influências de cool jazz.
Quanto a Liz Fraser, fez participações vocais em trabalhos de diversos artistas. Mudou-se com seu novo parceiro, Damon Reece (membro do Spiritualized) em 1998 para Bristol, lar da cena trip-hop inglesa. Em 1998 participou do álbum Mezzanine da banda Massive Attack nas faixas “Teardrop,” “Black Milk” and “Group Four”, chegando a acompanhar a turnê britânica da banda. No mesmo ano participou da gravação do disco de Craig Armstrong, The Space Between Us, com a canção “This Love” . Em 1999 foi convidada por Peter Gabriel para participar de seu controverso projeto conceitual OVO, que tratava da comemoração da chegada do novo milénio. Liz aceitou e compareceu em duas faixas “Downside Up” e “Make Tomorrow”. Também participou da gravação da trilha sonora de diversos filmes, entre os quais o britânico The Winter Guest e o americano In Dreams. Seus trabalhos mais recente são participações nas trilhas sonoras dos filmes O senhor dos Anéis: a sociedade do anel (Lothlorien (Lament for Gandalf)) e O senhor dos Anéis: As duas Torres (Isengard Unleashed).
Até o final de 2003 a gravadora 4AD está prometendo um relançamento de seis discos do Cocteau Twins originalmente lançados pelo selo: Garlands, Head Over Heels, Treasure, Victorialand, Blue Bell Knoll e Heaven or Las Vegas. Os álbuns serão digitalmente remasterizados por Robin Guthrie, e terão o design e a arte de capa revisados (o que está deixando os antigos fãs da banda preocupados). Esse relançamento é bastante justo, pois mesmo após o fim do grupo, e sem que seus ex-integrantes tenham, em suas carreiras solo, feito algo de semelhante relevo em comparação aos trabalhos antigos do Cocteau Twins, é inegável a importância que o grupo tem ainda hoje, influenciando diversos grupos e artistas da atualidade.
Fiquei impressionada com a voz da Elizabeth a primeria vez que ouvi, uma das vozes mais exoticas que tomau conta de minha mente (gruda mesmo a voz dela fica na cabeça). E aqui eu deixo um vídeo pra vocês perceberem que não estou mentindo
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